Memória descritiva___
Num exercício de observação e transferência de gestos do quotidiano para o desenho, foi realizada uma análise minuciosa dos movimentos e ações presentes no contexto de uma viagem de autocarro. Inicialmente, elaborou-se uma lista de palavras e gestos encontrados nesse ambiente, como o ato de subir ao autocarro, tirar o passe, validar, guardar o passe, caminhar, sentar, viajar, movimentar-se e sair. Essas ações repetidas constantemente foram as primeiras elações mencionadas nesta fase inicial do exercício.
A partir dessa etapa, foram produzidos desenhos, esquemas ou fotografias desses atos no próprio local, com o intuito de capturar a essência dos movimentos observados. Ao meditar sobre esses gestos quotidianos, decidiu-se incorporá-los e transferi-los para o desenho, levantando questões pertinentes: quando começa e quando termina cada ato? Qual a velocidade e a frequência desses movimentos? Amplia-se ou restringe-se o espaço do gesto? Separa-se ou une-se?
Através dessas indagações, exploraram-se diversas possibilidades de transferência dos gestos para o papel. O movimento inconsciente de "validar o passe" num autocarro tornou-se um gesto premeditado e inclusivo na folha de papel, materializado pela repetição de manchas feitas em grafite. Essa abordagem permitiu uma ressignificação do ato corriqueiro, transformando-o em um elemento compositivo no processo de criação artística.
Num terceiro momento, o gesto foi redirecionado e associado aos meios de desenho, utilizando-se a medição com a mão em conjunto com o movimento repetitivo sobre uma cadeira do autocarro. Realizaram-se, então, medições verticais e horizontais dos acentos do veículo, incorporando essa ação ao ato de desenhar. Essa estratégia possibilitou uma interação direta entre o artista, o espaço observado e os elementos que o compõem, resultando em uma representação gráfica que integra o gesto, a medida e a percepção do ambiente.
Esse exercício de observação, reflexão e transposição de gestos do quotidiano para o desenho demonstra a capacidade de ressignificar ações do quotidiano. Ao questionar a natureza dos movimentos, sua duração, velocidade e amplitude, explora-se novas possibilidades de expressão, tornando visível o invisível e transformando o banal em objeto de contemplação e criação.