Paola d’Andrea

MORAR AS FONTAINHAS

 

video

https://www.researchcatalogue.net/view/2511572/2511573

 

 

Morar as Fontainhas representa o reenactment da minha experiência de vida na minha carrinha camperizada na área de Fontainhas. Cheguei ao Porto em 18 de setembro de 2023 e, através de um aplicativo para campistas, a zona de Fontainhas foi recomendada como um local adequado para estacionar: acesso à água, vista panorâmica, rua fechada sem tráfego ou barulho. Vivi no Passeio das Fontainhas até 23 de setembro, dentro de um furgão com dimensões de 4,60 metros de comprimento, 1,80 metros de largura e 2,20 metros de altura, totalizando 16,56 metros cúbicos de espaço. Estacionando, transformei a rua em minha casa temporária.

Viver na rua é uma sensação semelhante a um desafio: às vezes

interessante, outras vezes frustrante, outras vezes estressante, mas também gratificante. É necessário desenvolver um sexto sentido para o local e as pessoas, permanecendo constantemente vigilantes e adaptando a rotina diária ao que nos rodeia. É importante estacionar perto de uma fonte de água ou abastecer antecipadamente; é possível deixar a porta aberta, mas talvez apenas durante o dia, e lembrar-se de usar o banheiro do bar próximo antes de ir para a cama; a cidade se torna nosso despertador e quando ela acorda, nós também acordamos.

A carrinha se torna uma casa móvel, uma membrana fina que nos

protege do exterior, mas também nos permite um diálogo constante com ele. Ao baixar as cortinas, nos escondemos, mas o mundo exterior permanece muito presente, e nossos sentidos se amplificam na tentativa de prever possíveis perigos e situações. Tornamo-nos mais sensíveis aos estímulos sensoriais: ouvindo

passos à noite, tentamos entender de onde vêm; ao ouvir gritos, tentamos

avaliar a distância deles; quando o camião de limpeza da rua passa de manhã, nos perguntamos se alguém virá bater para nos fazer perguntas; e quando os faróis de um carro iluminam o interior, às vezes temos a sensação de sermos "descobertos". Antes de dormir, verificamos várias vezes se todas as portas e janelas estão fechadas, sentindo-nos constantemente expostos.

 

Ao filmar, alternava frequentemente entre dois pontos de vista.

Em um deles, a câmera se torna meu olhar através do qual eu explorava e interrogava a área de Fontainhas enquanto realizava minhas atividades diárias, adaptando-me ao local como uma nova habitante. O outro ponto de vista é de dentro do minha carrinha, a membrana que me une e me separa do mundo exterior, outro filtro com o qual posso observá-lo. As janelas permitem enquadrar as diferentes dinâmicas que ocorrem na área de Fontainhas: turistas, trabalhadores, moradores da rua, passantes curiosos. A carrinha possui espelhos com os quais amplio meu olhar, mas também pontos cegos que ele não pode alcançar; a janela se torna um dispositivo visual, o olhar para o mundo exterior. Viver em Fontainhas reflete a possibilidade de redefinir continuamente nossa privacidade

e nosso espaço, oferecendo uma nova maneira de considerar a casa e ser casa para si mesmo. O espaço público se torna um elemento essencial de nossa habitação, tanto como estratégia de sobrevivência quanto como local para ampliar a comunicação e interação humana, pois os 16 metros cúbicos do furgão não são suficientes para satisfazer a necessidade humana de movimento e compartilhamento. A interessante experiência de não estar vinculado a um local específico nos faz sentir efêmeros na paisagem, enfatizando a importância da coisa pública e destacando a fluidez de nossa identidade como "cidadãos" em favor da de "habitantes".